sexta-feira, 25 de maio de 2018

Obrigado África, Obrigado Irmãos Africanos!


 
Como não ser grato e reconhecido pelo manancial de tudo quanto, generosamente, colocaste à minha disposição: a gramática da minha língua é africana, embora o meu verbo, maioritariamente, seja lusitano; a tez da minha cor e a fisionomia do meu ser são africanas, embora o meu sangue seja como todos os outros; o meu pensamento está aberto ao mundo, mas é moldado pela energia e pela força da África; por tudo isto, sou, orgulhosamente, crioulo, e possuo no meu DNA a marca indelével de um humanismo onde os povos e nações de todas as raças, de todas as cores, de todos os credos, de todas as filosofias se irmanam, no concerto da fraternidade, da solidariedade, do amor sem limites, da partilha das riquezas da cultura e da natureza, no equilíbrio, na equidade, na justiça, no respeito pelos direitos de todos e de cada um.

E para celebrar o 25 de Maio de 2018, a todos, mas particularmente aos irmãos africanos, dedico um extrato do poema Ode à África, do poeta da ilha do vulcão, Pedro Monteiro Cardoso:

“Africa minha, das Esfinges berço,
Já foste grande, poderosa e livre
Já sob os golpes do teu gládio ingente
..............................Tremeu o Tibre! (…)

Sim, fôste grande, dominaste o Mundo;
Mas hoje jazes sem poder, sem nada.
E ao férreo jugo das potências gemes
............................ Manietada.

Sôbre o teu corpo, ó meu lado leão dormente,
Vieram sôfregas nacões sentar-se
E, quais harpias truculentas, feras,
..............................Nele cevar-se...

Ó Pátria minha idolatrada e mesta,
Quando nos campos de batalha erguias
Teus estandartes, forte, não sonharas
..............................Tão tristes dias!

Se foste tu quem acendeu o facho
Que fez da Grécia a glória peregrina
¿Porque hoje vergas para o chão a fronte
..............................Adamantina?!

Vós que do túmulo dormis à sombra,
«quebrando a lousa do feral jazido»,
Surgi! erguei-vos dêsse pó, guerreiros
..............................Do Egipto antigo!

E tu, Aníbal, imortal caudilho,
Que a teus pés viste Roma prosternada,
Ergue-te e empunha novamente a lança
..............................Pela Líbia amada!

Cavalheiroso Abdel-Kader e Négus
E vós, valentes filhos dos sertões,
A lanças, chuços, expulsai-me todas
.............................Essas nações!

Mas ¿que digo? Antes repousai, guerreiros!
Benvinda seja a paz, seja benvinda!
Longe canhões a vomitar metralhas,
..............................E paz infinda!” (…)

terça-feira, 22 de maio de 2018

Germano Almeida: PRÉMIO CAMÕES 2018


 

Gostaria de felicitá-lo pela conquista deste importante galardão da língua portuguesa.

Em matéria de política linguística, nem sempre estivemos sintonizados pelo mesmo diapasão; porém, o uso que faz e fez da língua portuguesa; as numerosas obras escritas; a defesa permanente e convicta que sempre fez e faz dessa língua me convenceram que, um dia, mais cedo ou menos tarde, acabaria por conquistar o galardão que lhe acaba de ser atribuído.

É um prémio merecido. Creio que o mesmo reúne consenso no espaço lusófono e, aqui, na nossa Ribeira, certamente chega a atingir a unanimidade.

Tenho a subida honra de o parabenizar. O autor e a obra ganham com esta distinção; Cabo Verde e as letras caboverdianas ganham com um tal reconhecimento; na minha perspetiva, também a língua portuguesa ganha com o prémio atribuído.

É simbólico que a distinção aconteça no ano em que Cabo Verde vai assumir a presidência da CPLP e no ano, ainda, em que se realizou, em Cabo Verde, o VIII Encontro de Escritores de Língua Portuguesa.

O reconhecimento de Cabo Verde para com a língua portugues é grande. Com efeito, por opção própria, tem desempenhado o papel de língua oficial; uma parte importante da nossa história e cultura está moldada nessa língua; do seu casamento com algumas línguas africansa nasceu o nosso crioulo, e continua tendo uma presença dinâmica na nossa crioulidade; e na criação literária, ocupa um lugar de destaque.

Por tudo isto, o nosso muito obrigado à língua portuguesa e ao povo-berço que a criou e que a partilhou com o mundo. O nosso voto, então, é: que continue a partilhar o nosso mundo, em harmonia e cumplicidades positivas com a nossa língua materna de que é uma das progenitoras.

Ao Germano, que a musa crioula que o inspira a comunicar-se em português o leve, um dia, a premiar-nos com, pelo menos, uma obra na língua da nossa identidade primeira. E isto porque, quem até agora só escreveu em português, e que só é capaz de comunicar-se com a sua filha em crioulo, como chegou a declarar ao Michel Laban, no livro Encontro com os Escritores, tem o dever moral e cívico de, um dia, poder oferecer a essa mesma filha, e a nós todos deste rincão arquipelágico, temprados com o sal biológico e endógeno desse mar islenho e global que nos envolve, uma prenda, uma obra na língua da nossa afetividade mais profunda, e da nossa identidade mais genuína, que hoje como ontem, tem viajado nas asas da morna e na “mala” simbólica da diáspora, referida por Jorge Barbosa. A própria crioulidade tem viajado nas asas das letras dos nossos escritores, quando são traduzidos no exterior.

Fica o apelo, mas também o reconhecimento pela obra produzida na língua de Camões que também é nossa.