sábado, 29 de maio de 2021

Resposta ao Post de JLHA

 

 

Caro JLHA: Até Abril de 1979, todos, em Cabo Verde, escreviam com base no alfabeto português, salvo a escrita do “ka” adotado por um ou outro escritor, de forma não sistemática. Note-se que a experiência de António d’Paula Brito, de 1988, não era nem conhecida, nem praticada. Dela tive conhecimento em 1984, quando, pela primeira vez, visitei os EUA.

No Colóquio Linguístico de Mindelo, realizado na data acima referida, eu, por ter estudado em França o “funcionalismo” de André Martinet, um dos fundadores, juntamente com Jakobson e Troubtskoy, da Escola de Praga, sobre a ciência fonológica, onde vigora o princípio da bi-univocidade fonema-grafema, fiz parte da Comissão Técnica daquele Colóquio. A mesma Comissão apresentou e advogou um novo modelo de alfabeto e de escrita para o crioulo, isto é, o de BASE FONÉTCO-FONOLÓGICA.

A proposta foi sancionada pelo Colóquio. Note-se que a mesma fala de “alfabeto de base fonético-fonológica”. Isto significa que a escrita, também, seria de base fonético-fonológica ou seja:  deveria ser, tendencialmente, fonológica, tendo em conta os vários condicionalismos fonéticos ou, até, culturais que poderiam ir à contracorrente do princípio fonológico. Note-se que tanto o alfabeto como a escrita resultam da ciência, mas também do consenso.

Aliás, a aprovação experimental do ALUPEC, em 1998, com a representação dos sons palatais por “lh, tx, dj, nh, x, j” só foi possível porque o ALUPEC não é 100% fonético-fonológico, mas apenas tendencialmente fonético-fonológico.

Ora, este mesmo princípio poderá justificar o emprego do “e mudo” nas variantes do Norte,  sem que isto represente “completa subversão”,  sem que isto gere   “grandes disfunções e discrepância”, em relação ao ALUPEC.

Quanto ao “s” implosivo que, ao Norte, tem a prolação de “x” (lista, pista, vista…), é o princípio da bi-univocidade grafema/fonema que justifica a utilização do “s” e não “x”, no contexto referido. O mesmo se deve dizer da representação “s” e não “j”, em palavras como: “más, ves, vós” e não “maj, vej, vój”.

Como vês, caro JLH, se há alguém a subverter o ALUPEC, esse alguém não sou eu, seguramente.

 

Maio de 2021, Manuel Veiga

 

NB: Trata-se de uma resposta que dei ao José-Luís Hopffer Almada que escreveu na minha página do Facebook de 26 de Maio de 2021 o seguinte post:

Jose Luis Hopffer Almada

“Caro Manuel Veiga creio que a representação explícita do e mudo nas variantes das ilhas do Norte de Cabo Verde com e tem um grave senão, qual seja a completa subversão do princípio biunívoco fonético-fonológicos que presidiu à construção do alupec, designadamente a cada fonema um grafema, a cada grafema um fonema, com excepção dos dígrafos dj, tx, nh. Sendo assim, a letra e representaria sons completamente diferentes e num alfabeto oficial unificado como é o alupec levaria a grandes disfunçoes e discrepâncias Penso pois que esse tipo de compromissos é inaceitável. Sendo possível escrever as variantes do Norte sem sacrificar a coerência funcional do alupec, penso, como leigo que sou, mas também como escritor cultor do crioulo e usuário do alupec, que se deve explorar essas possibilidades todas. Parece - me pois preferível escrever tud ou tud' ou ainda sapot ou sapot' do que tude ou sapote. Ser fiel a certas sonoridades das variantes do barlavento cabo-verdiano e, por isso, usar o x em lugar do s, como emA pixta ou xkola, muito habitual, por exemplo, em Mário Matos, parece-me sumamente coerente com a base fonético-fonológica do alupec, embora pessoalmente preferisse o uso do s, como também se usa o m em lugar do n em, por exemplo, da-m em lugar de da-n, mesmo em se tratando da variante de Santiago. Abraços

 

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