No meu post de 11 de dezembro,
coloquei o texto da tradução do artigo 34º da Constituição, com a seguinte
redacção:
«Artigu 34º
(Efetu di pénas y mididas di suguransa)
Ninhun péna ô midida di suguransa ten, komu efetu nisisáriu, pérda di direitus sivil, pulítiku ô profisional, nen e ka ta priva kondenadu di si direitus fundamental, exsétu limitasons inerenti na sentidu di kondenason y na ezijénsias spesífiku di ruspetivu izekuson».
(Efetu di pénas y mididas di suguransa)
Ninhun péna ô midida di suguransa ten, komu efetu nisisáriu, pérda di direitus sivil, pulítiku ô profisional, nen e ka ta priva kondenadu di si direitus fundamental, exsétu limitasons inerenti na sentidu di kondenason y na ezijénsias spesífiku di ruspetivu izekuson».
O texto acima referido,
mereceu o seguinte comentário do Dr. Démis Lobo:
«Caro sr. Manuel Veiga, duas questões, uma gramatical e outra técnica,
respectivamente: primeira, será correcto dizer «di si direitus fundamental» ou
o correcto seria dizer «di sis direitus fundamental» ou «di sis direitu
fundamental». Imagine que quero traduzir para crioulo (variante de Santiago) a
expressão «os seus filhos». Como devo dizer «si fidjus», «sis fijus» ou «sis
fidju»? A segunda questão prende-se com o seguinte: traduzir a passagem «salvas
as limitações…» para «exsétu limitasons…» leva, no meu entendimento, a uma
interpretação incorrecta do preceito em causa. Preferiria que se dissesse:
«isu, sen pô em causa kes limitasons ki sta inerenti na sentidu di
kondenason...» (desculpa-me a escrita do meu crioulo). Com todo o respeito,
penso que estamos diante de um exemplo de uma tradução excessivamente literal,
o que irá comprometer a interpretação. Ora, se tratando da tradução da
Constituição, e não de um poema, de um conto, de um romance ou de uma novela;
cada palavra deve ser muito bem pesada, sob pena do futuro intérprete ser
levado a cair em erro. Cumprimentos e votos de um bom trabalho».
Devo responder-lhe dizendo:
Antes de mais, agradeço ao Dr. Démis
Lobo por se ter interessado pelo meu post,
tendo, inclusivamente, colocado um comentário, visando a procura de uma solução
que, eventualmente, poderá ser melhor, no seu entender. Devo , no entanto, informar-lhe que o texto
está de acordo com as normas que regem a morfologia do crioulo, no tocante ao
número.
Assim, a realização «ses direitu fundamental» está correcta.
E isto porque a morfologia do número, em crioulo, exige uma única marca do
plural que pode estar no determinante ou no determinado. Esta marca ou é um quantitativo («txeu kabra,
dôs algen»), ou é a desinência «s» («trabadjus di kanpu; nhas amigu; amigus
di-meu, ses amigu».
Assim, a frase «ses direitu
fndamental», para traduzir «os seu direitos fundamentais» está correcta. A
norma, é mesmo assim.
No caso de «si fidjus» (os seu
filhos), há um possuidor e várias «coisas»
possuídas Em «ses fidju), a frase é ambígua. Pode significar vários possuidores
e um «coisa» possuída; pode significar,
também, vários possuidores e várias coisas possuídas. O contexto
encarregar-se-á de iluminar a ambiguidade.
O que a gramática crioula tem dificuldade em aceitar, pelo menos neste momento, é a
realização «ses fidjus», com a marca do número tanto no determinante como no
determinado.
É o que se me oferece esclarecer
sobre a questão. Quanto à revisão da tradução que venho fazendo, por um
jurista, faz parte dos meus propósitos.
E isto, quando eu tiver todo o texto da Carta Magna traduzida. Neste momento, o
que faço, é tão-somente uma proposta de tradução. A socialização da mesma no
espaço do facebook é uma tentativa para provocar comentários enriquecedores.
Queira aceitar, caro Dr. Démis, as
minhas saudações.
A resposta que dei ao Dr. Démis Lobo mereceu o seguinte comentário por parte dele:
ResponderEliminar«Perfeitamente esclarecido, sr. Prof. Manuel Veiga , e muito agradecido pela sua atenção e pelo texto muito claro. Vejo que não tenho outra solução, se não arranjar tempo para estudar as regras gramaticais da escrita do cabo-verdiano (pelo menos as básicas). O poste chamou-me atenção pois, em primeiro lugar, trata-se da tradução para a língua cabo-verdiana da nossa Constituição e, em segundo lugar, por, curiosamente, em tempos, conversando com o Dr. Jose Luis Hopffer Almada, afloramos a possibilidade de abraçarmos o projecto da tradução para cabo-verdiano, precisamente, da Constituição da República de Cabo Verde e, ainda, por sugestão minha, a Declaração Universal dos Direitos do Homem que, como sabe, é parte integrante do nosso ordenamento jurídico, nomeadamente, por ser directamente recepcionada pela nossa Constituição, através do seu art. 12.º, n.º 1. No tocante à questão da revisão técnica, fico também satisfeito por esta fazer parte dos seus intentos. Ela, de facto, é indispensável, pois no Direito a interpretação é (quase) tudo. Por mais que uma tradução respeite todas as regras técnicas, é fundamental que, se tratando da tradução de um diploma normativo, que as palavras sejam escolhidas com “pinças ”, precisamente para que não conduzam o intérprete (jurista ou não) a um erro interpretativo. Como defensor da oficialização da língua cabo-verdiana, permita-me desejar-lhe as melhores venturas, a si e a todos quantos, na Universidade ou fora dela, vêm labutando para que a nossa língua materna possa um dia – esperemos, em breve - ter o estatuto de língua oficial. Os melhores cumprimentos».
O comentário de Démis Lobo mereceu a seguinte resposta, da minha parte:
ResponderEliminarCaro Démis Lobo,
Registo com apreço a sua compreensão, relativamente à explicação dada, sobre as questões que tinha levantado, quanto à tradução do artigo 34º da Constituição da República.
As suas colocações, em alguns aspectos, interpelam-nos. Com efeito:
1. O sintagma «os seus direitos fundamentais», pela explicação que dei, pode ser traduzido por : «si direitus fundamental». Aqui temos um possuidor e várias coisas possuídas.
2. O problema se põe quando temos vários possuidores e várias coisas possuídas. Ex: «Os seus filhos», sendo certo que os filhos são do Manuel e da Maria. Aqui, «ses fidju» é ambíguo. E «ses fidjus», embora a gramática do crioulo resiste em aceitar, é a realização que não induz à ambiguidade. Entretanto, os caboverdianos, neste específico caso, têm que consensualizar o plural no determinado e no determinante, mesmo que neste momento a realização seja um tanto ou quanto estranha.
Como bem afirma o Démis, o texto da Constituição não pode ter ambiguidades e, por isso, da minha parte, aceitaria, desde que seja consensual a presença do plural tanto no determinante como no terminado, quando há vários possuidores e várias coisas possuídas.
Como vê, Caro Démis, «na diskuson ki lus ta nase, sima nha Nacia Gomi, ta flaba». As suas observações podem não servir para o artigo 34º, mas podem ter cabimento em outros artigos onde tanto o determinante como o determinado estão no plural.
Saudações