terça-feira, 9 de agosto de 2016

Autonomização da Língua Caboverdiana, frase 20




LCV: Kumida bira ka ta pasa-l na garganta
MLP: Comida vira(r) negação TMA passar lhe na garganta
CSP: A comida começou a não passar-lhe na garganta

A RL (reestruturação local) diz respeito particularmente a ausência do artigo, ao verbo «virar», à negação “não”, à sintaxe verbal e à transformação do «lhe» em «-l».
O artigo não existe nas línguas africanasoriginárias do CCV. Assim, tomemos apenas a RL do «virar» que ainda não foi objeto de nenhuma análise .
O lexema conservou o significado de virar/voltar, mas também o de «transformar: «Djon bira pa el, txoma-l di buru» (o João voltou-se para ele e chamou-lhe de burro); «ténpu bira friu» (a temperatura desceu, isto é mudou de mais quente para mais frio); «mel bira fórti» ( o mel ficou avinagrado, isto é, houve a transformação de um estado para outro). Esses exemplos levam-nos a concluir que a semântica fundamental de «bira» é «virar ou voltar». Um «voltar» que pode ser tanto físico («e rabida pa mi» - voltou-se para mim), como também pode ter o sentido de transformar: «mel bira vinagri»; «ténpu bira friu». Em LCV, «bira» com o sentido de «transformar» parece ter um rendimento funcional muito maior que em Pt. Com efeito, em Pt não é muito corrente dizer-se « o mel virou avinagrado, o tempo virou frio». Há um outro campo semântico do «bira» em LCV que não conseguimos identificar em Pt: «bira si, txuba bira ta txobe» de repente a chuva começou a chover». O «bira» com o sentido de «de repente» e com o de «começar» é, ao que parece, uma reconstrução local.



(LCV: Língua Caboverdiana; MLP: Material Linguístico em Português; CSP: Correspondência Semântica com o Português; RL: Reestruturação Local).

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