INTERPRETANDO
FORMAL E CONCEPTUALMENTE
O ARTIGO 9º DA CONSTITUIÇÃO
A forma como está
redigido o artigo 9º da Constituição da República pode levar a interpretações que não se coadunam com o
espírito da lei. Eis como o mesmo se encontra redigido:
Epígrafe – Línguas
Oficiais;
1) É língua oficial o português. 2) O
Estado promove as condições para a oficialização da língua materna caboverdiana,
em paridade com a língua portuguesa. 3)Todos os cidadãos nacionais têm o dever
de conhecer as línguas oficiais e o direito de usá-las.
2)
Falemos da epígrafe. A
forma plural exibida só pode significar que o seu objeto, também, é plural,
isto é, trata-se de duas línguas que, no caso vertente, são o português e o
caboverdiano.
N primeira alínea afirma
“É
língua oficial o português”.
Note-se que não diz : “A língua oficial é o português”.
Gramaticalmente, isto significa que o articulado deixa espaço para a existência
de uma outra língua oficial que, ali ás, já vem anunciada na epígrafe. A forma
como o articulado vem redigido poderá querer significar que a língua oficial
que já preenche todos os requisitos de oficialidade é o português. A outra
língua, a caboverdiana, por ser materna, ainda pouco estudada, não fazendo
ainda parte do sistema formal de ensino, sem deixar de gozar do estatuto
oficial, precisa de ser elevada ao estatuto efetivo de paridade formal efetiva
com o português. Do mesmo modo, o português precisa de ser elevado ao estatuto efetivo
de paridade informal e ambiental, em relação ao caboverdiano.
Há que convir que a inteligência
do articulado da segunda alínea é,
precisamente, a construção das duas paridades: a paridade formal efetiva do
caboverdiano em realação ao português; a paridade informal efetiva do português,
em relação ao caboverdiano.
Aliás, a terceira alínea
que consigna “o dever que todos os cidadãos nacionais têm de conhecer as línguas
oficiais e o direito de usá-las” só tem sentido na interpretação das
duas língua serem já oficiais. Seria um absurdo exigir um dever e reconhecer um direito
de algo que não existe.
Havendo ambiguidade na
interpretação do artigo 9º da Constituição da República, como vimos
constatando, impõe-se que, formalmente, ele tenha uma redação clara, precisa,
objetiva e que não dê azo a nenhuma ambiguidade.
Eis a redação que ousamos propor:
Epígrafe – Línguas
Oficiais
1. São
línguas oficiais o português e o caboverdiano (conhecido também por crioulo
caboverdiano).
2.
O Estado promove as condições para a
construção progressiva da paridade formal e informal entre as duas línguas
oficiais da República.
3.
Todos os cidadãos nacionais têm o dever de
conhecer as línguas oficiais e o direito de usá-las.
Esta é, na qualidade de
linguista e de cidadão atento e engajado, a nossa proposta. Que o legislador
pondere a inteligência e pertinência da mesma.
Fevereiro de 2021
Manuel Veiga
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