Alguém, sabendo que eu me interesso pelas “coisas da língua”, colocou-me a pergunta, em epígrafe.
Eis a minha resposta: PADRONIZAÇÃO é a interiorização, a socialização e a
consensualização, numa comunidade linguística, de construções gramaticais, de
palavras e de expressões próprias de uma língua ou de suas variantes
geográficas, ou de domínios outros, dessa mesma língua, bem como ainda do modelo de alfabeto e de escrita.
No caso do nosso crioulo, com variantes que cobrem as nove ilhas habitadas,
a padronização será a interiorização, a socialização e a aceitação de
particularidades linguísticas dessas variantes. Por exemplo, no interior de
Santago diz-se “téta rixu”, correspondente, em Santanton a “brasa
gerrotxóde”.
Ora, no dia em que os santiaguenses interiorizarem e aceitarem o “brasa
gerrotxóde”, e os santantonenses, por sua vez, interiorizarem e
aceitarem “téta rixu” (ainda que com adaptação fonética (téta
rije), nesse dia, ou nessa altura, se pode dizer que se deu a
padronização das duas expressões.
Aguém poderá dizer que isto é “sonhar acordado”. Responderei
dizendo: se antes da Independência alguém me dissesse que, em Santiago, um dia encontraríamos
tanto a expessão “menina rei di bunita” como “menina bunita pa frónta”,
eu diria ao meu interocutor que estava a sonhar acordado. Hoje, após a
mobilidade social que se deu no pós-Indepencia, as duas expressões co-habitam,
pacificamente, em Santiago.
Acontece que essa padronização não se dá por geração espontânea. Ela só
pode dar-se com uso prolongado e com a socialização das duas expressões,
através da comunicação oral, do ensino, do uso na comunicação social, na
administração formal, na escrita, na literatura, nas artes e na cultura.
Isto significa que a padronização não se fixa por decreto, mas sim pela
interiorização e consensualização. O linguista-estudioso analisa a abrangência
e a consistência de tal consensualização e propõe que a palavra ou expressão
sejam consideradas padronizadas pela entidade competente. Assim sendo, a
padronização é mais um trabalho da cidadania do que de poderes públicos, e as
ilhas que quiserem que a sua variante entre no crioulo padrão têm que investir
social, cultural, cientifica e pedagogicamente na sua variante. Quem souber
investir "no mercado social e cultural, na na publicidade técnica e
científica" da sua variante ganhará a batalha da padronização.
Espero ter respondido a pergunta do meu interlocutor.
Dezembro de 2021, Manuel Veiga
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